URUGUAIANA JN PREVISÃO

Cátia Liczbinski

O direito à educação previsto na Constituição Federal, a adequada prestação de serviços e as mensalidades escolares

A educação formal e informal é um direito de todos e dever do Estado. Está prevista no artigo 205 da Constituição Federal de 1988: "A educação, direito de todos e dever do Estado e da família, será promovida e incentivada com a colaboração da sociedade, visando ao pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho". 

O isolamento social pelo qual o País está passando impõe aos estudos formais o resguardado às aglomerações e exige alternativas para garantir os estudantes o direito à educação pelos estabelecimentos de ensino.

Como a situação é única, muitas questões se apresentam e entram em conflito, pois a adequada prestação de serviços é um direito previsto no Código de Defesa do Consumidor e o abandono intelectual configura crime no Código Penal. Como garantir a educação para os alunos com qualidade? As mensalidades que até então eram cobradas com as aulas presenciais devem ou não permanecer com os mesmos valores? Qual a maneira de universalizar para todos os alunos o acesso à internet, a computador e ou celular com capacidade para assistir às aulas online?

É notório que não são todos os estudantes que possuem uma internet ou o acesso com qualidade para acompanhar as aulas. Segundo dados divulgados pelo Fundo das Nações Unidas para a Infância (UNICEF) divulgados em junho no Brasil, 4,8 milhões de crianças e adolescentes na faixa de 9 a 17 anos, não possuem acesso à internet em casa, além de o estudo também destacar as desigualdades sociais como a vulnerabilidade da região Norte e Nordeste. Outro ponto é a questão da qualidade da conexão que apresenta diferença em relação a contratação de pacote 3G ou acesso Wi-Fi, o que limita o tipo de conteúdo a ser acessado (como exemplo a região Norte e áreas rurais do Brasil).

Após algumas instituições já estarem utilizando esta forma de tecnologia, o Conselho Nacional de Educação (CNE) autorizou a oferta de atividades não presenciais em todas as fases do ensino, da educação infantil até o ensino superior, por meios digitais ou não, videoaulas, plataformas virtuais, programas de televisão, materiais didáticos impressos, dentre outras. A nova realidade levanta outra questão relevante relativa à cobrança das mensalidades e a possibilidade de redução delas em razão da inexistência de aulas presenciais.

Alguns estados brasileiros editaram normas para que as mensalidades escolares fossem reduzidas nesses períodos por diversos fatores, como a qualidade e acesso as aulas não presenciais e a questão do desemprego dos pais que impacta economicamente e pode ensejar o não pagamento das mensalidades. Em geral as reduções variam de 15% a 30% e possuem amparo legal no Código de Defesa do Consumidor.

Contudo, o STF foi provocado para a análise ao receber, em junho deste ano, três ações que contestam a constitucionalidade de decretos estaduais do Maranhão, Pará e Ceará, que permitem os descontos das mensalidades escolares durante a Pandemia. Um dos argumentos das ações é que não caberia aos Estados legislar em relação a contratos da área civil, o que por ora não foi acatado pelo STF. Os processos não possuem data para a julgamento e foram distribuídos para os ministros Alexandre de Moraes, Marco Aurélio e Edson Fachin.

Os decretos são oriundos de Estados que apresentam alta desigualdade social, pobreza e desemprego, o que corrobora outro aspecto já citado em relação à internet: mais da metade das famílias cuja renda é de até um salário mínimo não consegue navegar na rede em casa, enquanto na classe A apenas 1% não tem conexão.

A Lei 8.078/90 (CDC), no art. 22, impõe às Instituições de Ensino autorizadas pelo Poder Público a obrigação de fornecer serviços "adequados", "eficientes" e "seguros". O art. 6º inc. X, que trata dos direitos básicos do consumidor ao serviço, dispõe "adequado" e "eficiente", sendo obrigação dos mantenedores garantir aos alunos a realização efetiva de serviços de qualidade. Independente das tarefas descritas em contrato, a expectativa legítima do alunado é a de um aprendizado eficaz, adequado aos hábitos e costumes do tempo atual. Se o fato não está ocorrendo se caracterizará o vício que pode ensejar responsabilidades.

Considerando a situação atípica e aguardando as decisões do STF, algumas cautelas são necessárias pois o Estado brasileiro não estava preparado para a situação da PANDEMIA: sem políticas públicas adequadas toda a sociedade e seus setores sofrem as consequências de forma negativa e econômica. Levando isso em conta, professores e estabelecimentos de ensino não podem deixar de atuar em razão do direito à educação de todos e, caso isso ocorresse, geraria desemprego e miséria, além de outras consequências importantes para a educação brasileira. Nesse sentido algumas medidas são recomendadas pelo Ministério Público e pelo Procon, como:

a) Por existir um contrato de prestação de serviços educacionais que deve obedecer a carga horária determinada pela Lei de Diretrizes e Bases da Educação, a escola deve repor aulas eventualmente não ministradas e os descontos podem ser oferecidos em caso de prestação de serviços acessórios aos educacionais, se esses não forem prestados.

b) Em relação às aulas online não há ainda decisões, pois elas vão depender de lei ou do STF no julgamento das ações. Caso esteja sendo ofertada com a mesma qualidade não haverá a obrigatoriedade de redução da mensalidade.

c) O fornecimento de aulas on-line não enseja a ruptura do contrato, uma vez que os alunos têm o dever de estarem matriculados, porque, se assim não for, os pais ou responsáveis podem sofrer processo por crime de abandono de intelectual.

d) As partes podem negociar a redução dos valores das mensalidades por meio das pessoas autorizadas representando todos os alunos e a instituição, e são necessários a boa-fé e bom senso parte de todos. O artigo art. 6º inciso V do CDC autoriza solicitar a revisão das cláusulas contratuais em razão de fatos supervenientes (coronavírus - covid-19) que as tornem excessivamente onerosas.

e) Em relação ao transporte escolar, as partes envolvidas devem cooperar entre si para que se obtenha uma solução justa e efetiva, de modo a preservar o equilíbrio e a boa-fé nas relações de consumo, reduzindo a mensalidade ou até mesmo o não pagamento do período em que o serviço estiver suspenso.

Embora todas as dificuldades enfrentadas em relação à educação em 2020, é preciso acreditar que "A educação é a arma mais poderosa que você pode usar para mudar o mundo" (Nelson Mandela), portanto é importante que a educação seja valorizada por meio de Políticas Públicas eficientes.


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