Cátia Liczbinski
A necessidade de uma mulher para o STF: o legado de Barroso e o desafio da representatividade

O anúncio da aposentadoria do ministro Luís Roberto Barroso marca o encerramento de um ciclo relevante no Supremo Tribunal Federal (STF) e abre um debate crucial para a democracia brasileira: quem ocupará sua cadeira? Constitucionalista brilhante, professor e defensor da dignidade humana, Barroso deixa um legado de coragem e lucidez. Foi relator de decisões históricas, do reconhecimento da união homoafetiva à interrupção da gestação de fetos anencéfalos, e sempre reafirmou que “a Constituição é o pacto da civilização.”
Esse pacto, porém, ainda está incompleto. Em mais de 130 anos, o STF (composto por 11 pessoas de notável saber jurídico e reputação ilibada) teve apenas três mulheres, Ellen Gracie, Cármen Lúcia e Rosa Weber, e nenhuma mulher negra. É um dado que grita. Em um país onde as mulheres negras são demograficamente maioria, compondo mais de 28% da população brasileira, é inaceitável que não exista nenhuma representatividade desse grupo na instância máxima da Justiça. A ausência de diversidade no Supremo revela que o poder ainda reflete uma elite restrita, distante da realidade de quem mais depende do Estado para ver seus direitos garantidos.
É paradoxal, um Tribunal que decide sobre igualdade racial, direitos das mulheres e justiça social ter sido e permanecer majoritariamente masculino e branco, diante da realidade desigual do Brasil?
O novo ou nova representante do STF deve ser um avanço civilizatório. O Brasil tem mulheres plenamente capacitadas para ocupar o cargo, como Débora Duprat, ex-vice-procuradora-geral da República; Sylvia Steiner, ex-juíza do Tribunal Penal Internacional; Daniela Teixeira, ministra do STJ; e juristas negras de excelência como Silvânia da Silva Araújo, desembargadora atuante na defesa da equidade racial e de gênero; e Cida Bento, referências éticas na luta contra o racismo institucional.
Relembrando Barroso, que “o papel do juiz constitucional é promover avanços civilizatórios, mesmo quando isso desafia as zonas de conforto”,incluir uma mulher no STF e negra seria aumentar a representatividade social, um ato simbólico, uma reparação histórica, para uma democracia mais inclusiva e representativo com esperança de transformação.
Ter uma mulher negra no Supremo, seria além de uma Ministra, mas um símbolo da Constituição de 1988, refletindo o que o Brasil é na realidade: diverso e resiliente, sabendo-se que quase 52% da população brasileira é composta por mulheres. O legado de Barroso será verdadeiramente honrado se, em seu lugar, sentar-se uma mulher que leve à toga não apenas o saber jurídico, mas a força de quem sempre precisou lutar para ser ouvida.
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