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SETEMBRO VERDE

“Conscientização é a palavra”, diz médico sobre doação de órgãos

Gabriela Barcellos/JC imagem ilustrativa - fireção ilustrativa - Médico Luiz Fernando Cibin, coordenador da Comissão de Captação de Órgãos do Hospital Santa Casa.

O dia 27 de setembro é o Dia Nacional da Doação de Órgãos, uma espécie de Dia D da campanha Setembro Verde, instituída em 2014 com o objetivo de conscientizar a sociedade sobre a importância da doação e, ao mesmo tempo, fazer com que as pessoas conversem com seus familiares e amigos sobre o assunto. Instituída pela Lei nº 11 584/2007, a campanha visa nos fazer pensar na importância deste ato de amor e altruísmo.

Há duas formas de doação: a partir de doador vivo, que pode doar um dos rins, parte do fígado, parte da medula ou parte dos pulmões para parentes até o quarto grau e cônjuges – a doação de órgãos de pessoa vivas que não são parentes só acontece mediante autorização judicial. E a partir de doador cadáver, que recebe diagnostico de morte encefálica. Neste caso, é possível doar ambos os rins, o coração, pulmão, pâncreas, fígado e intestino; além de córneas, válvulas, ossos, músculos, tendões, pele, cartilagem, medula óssea, sangue do cordão umbilical, veias e artérias.

No Brasil, apesar de a maior parte dos transplantes serem realizados a partir de um doador cadáver, não há uma regulamentação que permita ao cidadão se declarar doador ainda em vida, para que em caso de morte cerebral, esta vontade seja respeitada. Atualmente, a legislação brasileira determina que a família será a responsável pela decisão final e vem daí a importância da conversa com os familiares a fim de informá-los a cerca deste desejo.

Apesar da ampliação da discussão sobre o tema nos últimos anos, se trata ainda de um assunto polêmico e de difícil entendimento, o que acaba resultando em um alto índice de recusa familiar a doar.

Captação

O Hospital Santa Casa de Uruguaiana é uma das instituições captadoras de órgãos no Estado, através da Comissão Intra-Hospitalar de Doação de Órgãos e Tecidos para Transplante (Cihdott). O grupo é coordenado pelo médico pneumologista Luiz Fernando Ximenes Cibin. O grupo é formado ainda pelas psicólogas Mariana Queiroz Bermúdez, Bruna da silva Calvi, Carolina Maidana Pinto; os enfermeiros Marcelo Pituco da Silva, Candisse Roseli Arend Dias, Deisy Mello de Pinto, Diana Mallmann Pozzobom, João Pedro Sperluk Arce, Gustavo Pereira Cabral; as assistentes sociais Fabiana Arnoldo Winck, Lidiane Peres Diane Vieira e Catia Ciliene Rodrigues Mazzaro; a auxiliar de faturamento Giliane pereira Suarez.

Neste ano, a Cihdott fez a captação de órgãos de dois doadores: uma mulher, que doou ambos os rins e as córneas, e um homem do qual foram captados ambos os rins e o fígado. Com exceção das córneas, todos os órgãos foram implantados com sucesso.

Em 2022, também foram duas captações: um doador homem, do qual foram captados ambos os rins; e uma doadora mulher, que doou ambos os rins e o fígado. Todos os órgãos foram implantados com sucesso. Antes disso, o HSCU ficou cinco anos sem captar órgãos.

De acordo com a Secretaria Estadual de Saúde (SES/RS), de janeiro a agosto deste ano foram 543 notificações de morte encefálica no Estado. Deste total, apenas 186, ou 34%, resultaram em transplante. Somente no mês de agosto, foram 69 mortes cerebrais, das quais 22 resultaram em doação de órgãos, um percentual de 32% - o segundo menor do ano, atrás apenas de janeiro, quando 30% dos casos de morte encefálica resultaram em doação.

Na comparação com o mesmo período do ano passado, o número de doações apresentou um pequeno aumento. No entanto, este aumento pode não significar uma maior conscientização sobre o tema, mas estar diretamente relacionado à pandemia de covid-19. “Provavelmente aumentou porque no período da pandemia os processos tanto de diagnóstico como de doação de órgãos ficaram um pouco engessados. Então quando terminou a pandemia, houve um aumento, que foi observado em todo o Brasil”, explica o médico Luiz Fernando Cibin.

Por que o número de doações é tão pequeno

Atualmente mais de 2,8 mil pessoas aguardam um transplante no RS e o número de doações ainda baixo. A partir dos dados divulgados pela SES/RS, é possível verificar que a negativa familiar continua sendo a principal causa da não efetivação das doações. Neste ano, em 162 casos a família optou por não fazer a doação. Este cenário não é diferente do restante do mundo e, atualmente, a Espanha é o país que tem a melhor taxa de aceitação da família, um modelo muito conhecido no mundo todo e que se tenta seguir.

A desinformação é apontada como o principal motivo que leva os familiares a não aceitarem doar. Há descrença e dificuldade em entender o diagnóstico de morte encefálica. Outro ponto relevante são os fatores culturais e religiosos. Para Cibin, o caminho para vencer este desafio é a conscientização. “O que precisa é cada vez mais informação, mais conscientização das pessoas sobre a importância da doação, sobre a seriedade do processo de diagnóstico de morte encefálica. Conscientização é a palavra!”, enfatiza.

O médico explica que há outros desafios a serem superados. “Às vezes a gente não consegue fechar o protocolo por falta de exame, pela logística. Em algumas situações, a doação não pode ser feita pelas condições clínicas do paciente, que se agravaram”, explica. O médico aponta ainda que, após o diagnóstico de morte encefálica, outros testes são realizados e, a partir destes, podem surgir contraindicações que impedem a doação. Por fim, ele destaca que Uruguaiana enfrente um outro revés. “A distância de Uruguaiana até Porto Alegre e até o clima. Às vezes o avião com a equipe para fazer a captação não vem por causa do clima, porque tem chuva. Às vezes o aeroporto não funciona à noite. Localmente a gente tem essas limitações também”, lamenta.

Cenário atual

Neste ano, de acordo com a SES/RS, foram captados 494 órgãos – 360 rins, 105 fígados, 23 pulmões e seis corações.

Os processos de doação de órgãos concluídos com sucesso no Estado neste ano resultaram em 339 transplantes de rim, 101 transplantes de fígado, 25 de pulmão, oito de coração, e um de fígado e rim. Entre os transplantes de tecidos foram 503 de córnea, 103 de esclera, 266 de osso e 12 de pele. Nestes dados estão incluídos órgãos captados no Rio Grande do Sul e em outros estados.

Atualmente, 2 877 pacientes seguem aguardaram por um órgão na lista de espera de transplantes no Estado. A maioria deles aguarda por um rim, 1 307 pessoas; 169 aguaram um fígado; 62 aguardam um pulmão; e 16 aguardam um coração. Já entre os tecidos, 1 202 pacientes aguardam por transplante de córnea e 121 aguardam por um transplante de medula óssea.

Como ser um doador

Atualmente, não há nenhuma forma legal de se de tornar doador de órgãos após sua morte. A decisão quanto a isso será da família. Portanto, a conversa com a família sobre o tema é fundamental para quem deseja, em caso de morte encefálica, ser doador. Caso seja seu caso, converse com seus familiares e deixe claro sua intenção.


COMO FUNCIONA A DOAÇÃO DE ÓRGÃOS?

Jornal CIDADE: Uma vez constatada a morte encefálica, quais os critérios para ser doador?

Luiz Fernando Cibin: Primeiramente, a família precisa autorizar a doação e esse paciente não pode ter nenhuma contraindicação. Ele também precisa estar clinicamente estável e ter condições para fazer o procedimento cirúrgico, passar pelo procedimento de captação.

As contraindicações são: tumores malignos, com exceção dos carcinomas basocelulares da pele, carcinoma in situ do colo uterino e tumores primitivos do sistema nervoso central; sorologia positiva para HIV ou para HTLV I e II; sepse ativa e não controlada; tuberculose em atividade; e infecções fúngicas ou virais graves, exceto hepatites B e C.

JC: Ainda há muitas dúvidas e incertezas sobre o diagnóstico de morte encefálica. Como ele é realizado?

Cibin: Desde 2017 existe um protocolo padrão, que é utilizado em todo o Brasil. São dois médicos com treinamento específico para isso e o paciente passa por dois testes clínicos, um teste de apneia e depois um exame complementar. Desde a implantação desse protocolo, tudo ficou ainda mais seguro.

JC: Recentemente, o ‘caso do apresentador Faustão levantou muitos questionamentos acerca da fila de espera e de como é feita a destinação do órgão. O que pode falar sobre isso?

Cibin: As pessoas tendem a desconfiar quando isso acontece por ser uma pessoa de poder aquisitivo alto e pela rapidez com que tudo ocorreu, mas todo esse processo é muito correto e criterioso, baseado na compatibilidade e depois na urgência. Vamos imaginar um paciente com morte cerebral que vai doar o coração. Esse coração é levado para o centro de transplante, onde serão realizados vários testes, como grupo sanguíneo e testes de compatibilidade – que incluem até mesmo o tamanho do tórax dos pacientes –, a partir dos quais são identificados os potenciais receptores. A partir destes testes, essa fila de potenciais receptores vai ficando menor. E então é considerado também a urgência do procedimento. Digamos que tu tens cem pessoas aguardando um coração e destas três são compatíveis e podem receber esse coração. Destas três, será escolhido aquele paciente que está em situação mais grave.

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