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Boate Kiss

Um ano após o júri, qual a situação do processo?

Há exatamente um ano terminava o julgamento pelo tribunal do júri mais longo da história do Judiciário gaúcho. O processo trata da responsabilidade criminal pelo incêndio na Boate Kiss, em Santa Maria, ocorrido em 27 de janeiro de 2013. No banco dos réus, os donos da boate, Elissandro 'Kiko' Callegaro Spohr e Mauro Londero Hoffmann, e Marcelo de Jesus dos Santos e Luciano Bonilha Leão, integrantes da banda Gurizada Fandangueira, que se apresentava na casa no momento do sinistro.

Naquela sexta-feira, os quatro foram condenados por homicídio simples com dolo eventual, após um julgamento recheado de nulidades. Kiko a 22 anos e seis meses de prisão, Mauro a 19 anos e seis meses, e Marcelo e Luciano a 18 anos cada. Hoje, um ano depois, os quatro passaram mais de oito meses presos, a condenação não é mais válida - foi anulada pelo Tribunal de Justiça por conta de irregularidades no julgamento -, e se aguarda o julgamento dos recursos impetrados pelo Ministério Público para anular a anulação. Enquanto isso, sobreviventes, familiares de vítimas, réus, advogados, e todos os envolvidos no processo - em tramitação há quase dez anos - seguem na angústia de não ver 'o final da história'.

Prisão

Ainda naquele 10 de dezembro, os quatro acusados - hoje não mais condenados - tiveram a prisão preventiva decretada pelo juiz que presidiu o júri, Orlando Faccini Neto, com base no chamado pacote anticrime, que abriu a possibilidade de cumprimento imediato em caso de condenação pelo júri a penas superiores a 15 anos. A prisão, porém, não ocorreu em razão de um habeas corpus preventivo concedido liminarmente pelo desembargador Manuel José Martinez Lucas, da 1ª Câmara Criminal do TJ.

Seis dias depois, uma manobra do Ministério Público, que ingressou com uma suspensão de liminar junto ao Supremo Tribunal Federal (STF) encontrou o amparo do então presidente do STF, ministro Luiz Fux, que derrubou o HC e determinou a prisão dos quatro. Mesmo com a manutenção do habeas corpus pela 1ª Câmara em julgamento de mérito, os quatro continuaram presos. Isso porque um novo pedido do MP chegou a Fux e foi atendido, tornando sem efeito o salvo-conduto do TJ. A decisão de Fux foi duramente criticada e considerada ilegal por especialistas em Direito Penal de todo o País, por suprimir instâncias e fundamentá-la em lei que não se aplica ao caso. O próprio Fux chegou a decidir diferentes em pedidos semelhantes realizados em outros processos.

Em razão da prisão, as defesas de Kiko Spohr e de Mauro Hoffmann buscaram a Corte Interamericana de Direitos Humanos, mas até o momento não houve manifestação da corte.

Anulação do júri

Kiko, Mauro, Luciano e Marcelo somente deixaram a prisão na noite de 3 de agosto, quando a 1ª Câmara Criminal anulou, por maioria de votos, o júri e, consequentemente, a condenação.

As apelações das quatro defesas pediam a anulação do julgamento, para que eles fossem levados a novo júri. Nas razões, destacavam diversos pontos que consideram nulidades, que vão desde o sorteio dos jurados até a referência ao silêncio dos réus por parte da acusação, passando pela imparcialidade do juiz, que entre outras decisões questionáveis, permitiu manifestações de familiares e vítimas presentes no salão do júri.

Os desembargadores José Conrado Kurtz de Souza e Jayme Weingartner Neto reconheceram cinco das 19 nulidades apontadas pelos advogados, entre elas nulidades no sorteio dos jurados e inovação de tese acusatória em replica, pelo Ministério Público em relação ao sócio investidor da Kiss, Mauro Hoffmann.

No final de outubro, a 1ª Câmara Criminal julgou o primeiro dos recursos apresentados pelo Ministério Público contra a decisão de anular o júri, os embargos de declaração. Em regra, eles não têm a função de modificar o resultado da decisão - no caso concreto, reverter a anulação do júri -, mas sim sanar omissões, aclarar obscuridades e corrigir eventuais erros materiais em julgados.

O Ministério Público defendia a ocorrência de preclusão (perda do direito de manifestação no processo) e inexistência de prejuízo concreto às defesas dos réus nas questões consideradas nulas pela 1ª Câmara. No julgamento, por unanimidade, os desmembradores negaram tais pedidos, mantendo assim inalterada a decisão de anular o júri.

Situação atual

Atualmente, os quatro acusados seguem respondendo em liberdade - como ocorreu ao longo de praticamente todo o processo.

O Ministério Público busca reverter a decisão que anulou o júri por meio de um recurso especial destinado ao Superior Tribunal de Justiça (STJ) e recurso extraordinário ao Supremo Tribunal Federal (STF). As defesas, por sua vez, se mostram confiantes da manutenção da decisão do TJ. No entanto, até o momento, nenhuma delas foi intimada sobre os recursos a fim de apresentar as chamadas contrarrazões, ou seja, suas considerações acerca dos pedidos do MP.

Não há prazo para que haja esta intimação, mas de acordo com o advogado Mário Cipriani, que juntamente com Bruno Seligman de Menezes responde pela defesa de Mauro Hoffmann, é improvável que ocorra antes do recesso forense, que inicia no dia 20 de dezembro.

As defesas aguardam ainda a abertura de prazo para também apresentar recurso ao STJ e STF. "É possível que as defesas também recorram tentando angariar mais nulidades além das que já foram reconhecidas, e aumentar o rol de nulidades, mostrar com mais força ainda o show de horrores que foi o júri. Analisamos essa possibilidade", explica Cipriani.

Tal recurso, se houver, tramita paralelamente aos recursos do Ministério Público e, portanto, não deve trazer maior morosidade ao processo.


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