URUGUAIANA JN PREVISÃO

Briane Machado

Será que Hamurabi cancelaria?

Antigamente, os povos que viviam na Mesopotâmia possuíam grande diversidade entre si, o que necessitou de organização para melhor administrar tais diferenças. Por isso, o Rei Hamurabi criou o Código de Leis da Babilônia, o qual foi baseado nas Leis de Talião, o famoso "olho por olho, dente por dente". Antes disso, as leis eram transmitidas "boca a boca", ou seja, corria o sério risco de uma falsa ou errônea interpretação, causando discórdia na nação.
Séculos após a criação do Código de Hamurabi e da forma perversa de julgamento pelos descumprimentos das normativas babilônicas, entramos na atmosfera globalizada, ou seja, ao mesmo tempo em que ganhamos uma ferramenta para facilitar a vida, o trabalho, o estudo, a pesquisa e a tecnologia, somos expostos, constantemente, na "terra de ninguém".
A evolução contínua que acontece na velocidade da luz nos dá mecanismos suficientes para que um fato que ocorreu em outro continente seja de conhecimento mundial em poucos segundos.
Antigamente, os acontecimentos eram escritos em livros alguns anos depois do ocorrido, após, eram contados em cartas, jornais locais e, sucessivamente, alcançamos os telégrafos, a linha telefônica, as mensagens de texto, até chegarmos a vastidão que as redes sociais proporcionam - cabe a cada um saber se essa entrega é positiva ou não.
O imediatismo em que vivemos atualmente nos faz acreditar que podemos fazer o juízo de valor de outrem sem mesmo conhecer a totalidade da história que vem sendo propagada.
Em questão de segundos, uma pessoa vira um mártir ou um criminoso sem direito a defesa. E, logo temos uma sociedade inteira voltada para a cultura do cancelamento.
O "olho por olho, dente por dente" está diferente, né?!
Todo dia somos colocados diante de inúmeras frases sobre gratidão e empatia e, ao mesmo tempo, é só rolar o "feed" que temos alguém sendo veementemente criticado e, obviamente, cancelado.
Aquele ser humano está marcado como um criminoso, sendo julgado pela coletividade, sem direito a defesa, nem mesmo de expor a sua própria verdade. Pra quê? Ele já foi condenado.
Esquecemos os valores humanos que estamos tentando propagar desde que atrocidades foram cometidas no passado.
A notícia "boca a boca" vale mais do que qualquer explicação plausível e ninguém está preocupado com a toxidade psicológica e desestabilização emocional que àquela pessoa foi exposta. Não há responsabilidade com fatos, nem análise prévia de danos.
"Se fulano falou deve ser verdade mesmo".
E pessoas vão sendo canceladas dia após dia.
Mas, será que alguém se preocupou em lhe dar direito de resposta? Em ouvir a sua história? Em saber se os fatos foram distorcidos como acontecia na Mesopotâmia?
O julgamento social é capaz de acabar com a estabilidade de um ser humano, mesmo que ele nada tenha feito. A capacidade de tornar alguém culpado é tão grande que, dentro da sua inocência, pode acabar acreditando que aquele fato inventado ou distorcido é, realmente, verídico.
O tempo vai passar e outra pessoa será cancelada. Talvez, até no mesmo dia ou horas depois.
Entretanto, os danos causados aquela pessoa não serão facilmente apagados.
Não se trata de garantismo ou defesa prévia, mas de dar a possibilidade de esclarecimento antes de um julgamento social.
Cancelar uma pessoa é tirar dela o direito de reabilitação, de melhorar. Por si só, é pior do que a Lei de Talião.
Todo dia alguém comete um erro. Todo dia alguém está tentando evoluir.
Quando uma pessoa aponta o dedo para outrem, quando joga pedras, cancela o processo. O seu e daquele que está sendo previamente julgado.
Antes de cancelar, lembre-se que flocos de neve são puros.
Já vistes alguém caindo do céu e nevando por aí?

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