URUGUAIANA JN PREVISÃO

Briane Machado

Raridades

Confesso que eu não sou a pessoa que costuma transitar por pontos turísticos da cidade com frequência - talvez, por falta de tempo.
Desde que o "novo normal" se apresentou, eu deixei de fazer o mesmo trajeto do trabalho até o carro e vice-versa.
Antes, todo dia eu passava na praça central da cidade e observava cada detalhe, por mais que o tempo fosse corrido.
Às vezes, parava para fotografar a Igreja Matriz em suas mais variadas cores - a depender do tempo que se apresentava.
A paisagem nunca era a mesma. Pelo contrário, desde folhas no chão até o tom acinzentado dos dias chuvosos.
Na primavera, flores cor de rosa enfeitam uma das esquinas da praça.
No centro, é possível ter uma visão privilegiada da Igreja, ornamentada por árvores centenárias.
No intervalo do almoço, o fluxo no trânsito, as pessoas saindo do trabalho, crianças voltando da escola escutam o sino anunciando que o primeiro turno foi completado.
Não eram raras as vezes em que parava na banca de revistas para olhar as novidades, já sentindo o aroma do restaurante ao lado.
Prenúncio do almoço.
O chafariz, quando ligado, enfeitava com o balé das suas águas aquela porção verde no centro da cidade.
Por vezes, encontrava o Espeto passeando e fazendo amizade.
Uma rotina que, mesmo sendo acostumada, sempre tinha alguma coisa diferente a observar.
Ontem, depois de mais de um ano sem fazer o mesmo trajeto até o escritório, passeei na Praça Central, a qual continua com a mesma exuberância, porém, sem crianças brincando na estátua do Barão, sem os grupos de senhoras conversando pelos bancos, sem os cães passeando no final da tarde.
Talvez, tenha perdido um pouco do encanto, das vozes, dos sons. Ou eu passei tão rápido que não parei para observar as mudanças.
O chafariz não estava ligado.
A vida mudou. E a visão que antes se tinha de um dos pontos turísticos da cidade foi afetada pela urgência de não ficar exposta, de não correr riscos, de verificar a cada minuto se a máscara está devidamente fixada no rosto.
Contamos centímetros de distância das outras pessoas, evitamos todo e qualquer contado "desnecessário". O tempo fora de um "campo seguro" é cronometrado e, cada vez mais, nos sentimos parte integrante da mobília de casa.
Talvez, estejamos como um dos monumentos espalhados pela praça: estáticos.
Porém, precisamos agradecer pela possibilidade de estarmos quietos, imóveis, quando nem todos têm o direito de se resguardar.
Ontem, depois de muito tempo, parece que voltei a me sentir integrante da cidade - mesmo que o meu "passeio" tenha durado menos de 2 minutos e sem direito a parada na banca de revistas.
O que sempre foi tão simples está fazendo falta.
E como estão cada vez mais raros os momentos em que podemos respirar ao ar livre sem preocupações.
A vida é tão rara.

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