URUGUAIANA JN PREVISÃO

João Eichbaum

Ainda o artigo 142

O atrofiado vernáculo empregado no artigo 142 da Constituição revela o grau de cultura dos constituintes: "as Forças Armadas, constituídas pela Marinha, pelo Exército e pela Aeronáutica, são instituições nacionais permanentes e regulares, organizadas com base na hierarquia e na disciplina, sob a autoridade suprema do Presidente da República, e destinam-se à defesa da Pátria, à garantia dos poderes constitucionais e, por iniciativa de qualquer destes, da lei e da ordem".

O uso da conjunção aditiva "e", ("e destinam-se") para ligar a oração principal a uma oração explicativa, violou a natureza dessa última. Sendo oração subordinada, ela foi transformada em coordenada sindética.

Do Direito mal escrito não se pode extrair raciocínio depurado pela lógica. As impropriedades gramaticais tiram a clareza da expressão. Então cada jurista toma o rumo que lhe convém, ou que caiba no tamanho de sua cultura.

Em artigo publicado no jornal Valor, as jornalistas Isadora Peron e Luíza Martins transcrevem trechos de uma entrevista com Gilmar Mendes. Segundo elas "o ministro não vê como papel das Forças Armadas avaliar quando um Poder invade a competência do outro". E mais disse o loquaz Gilmar: "Acho que se instalou no país uma grande loucura, uma grande confusão. Recentemente eu disse que essa tese é uma tese de lunáticos. É uma viagem de lunáticos. O artigo 142 tem uma discussão muito importante que é a missão das Forças Armadas para proteger poderes constitucionais e assegurar a lei e a ordem a pedido de um dos Poderes, mas é só isso".

O que Gilmar Mendes não disse, mas deveria dizer, se conhece a fundo o Direito Constitucional, é que o artigo 142 não é autoexecutável. Ele precisa de uma lei que o torne exequível, se e quando necessário for. E aí se apresenta com tal finalidade a Lei Complementar nº 97.

No artigo 15 ela estabelece que "o emprego das Forças Armadas na defesa da Pátria e na garantia dos poderes constitucionais, da lei e da ordem, e na participação em operações de paz, é de responsabilidade do Presidente da República..." E nos §§ 1º e 2º atribui ao Presidente a iniciativa e diretrizes nas operações das FFAA em casos tais.

Agora o Fux, em Ação Direta de Inconstitucionalidade desse artigo, deferiu estranha liminar, descumprindo o art. 10 da Lei 9868/99, já que existem sessões virtuais, dizendo que "a chefia das Forças Armadas é poder limitado, excluindo-se qualquer interpretação que permita sua utilização para indevidas intromissões no independente funcionamento dos outros Poderes, relacionando-se a autoridade sobre as Forças Armadas às competências materiais atribuídas pela Constituição ao Presidente da República".

A redação obscura e coleante da decisão viaja entre a vacilação e mal difarçada timidez. Dessa pobreza dialética emerge apenas a ideia de que, para a democracia, valem mais os erros de onze togados do que a disciplina de milhares de soldados. Mas o certo é que, entre os poderes constitucionais, não existe dança de cadeiras, e alguém precisa ter coragem para terminar com o baile.

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