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João Eichbaum

Adeus para Sérgio

O Ministério Público do Rio Grande do Sul perdeu o nome mais ilustre de suas fileiras na área da cultura, e a literatura gaúcha ficou mais pobre, com o passamento de Sérgio da Costa Franco.

Referência indispensável em pesquisas sobre a história de nosso Estado, e dono de textos exemplares no jornalismo gaúcho, como cronista que foi, durante longo tempo, do jornal Correio do Povo, Sérgio da Costa Franco pertence àquela grei de talentos que modela o próprio entendimento segundo os padrões da erudição humana. Não era pernóstico ao escrever, não deixava transparecer vaidade. Não escrevia em busca de prosélitos. Longe de dele arrebanhar admiradores.

Seus textos eram escorreitos, leves, acessíveis a qualquer leitor, sem os solavancos de palavras desnecessárias. Muitas vezes, o adjetivo incomum junto ao substantivo banal, ou o substantivo erudito posando ao lado do adjetivo vulgar, emprestavam uma harmonia musical ao texto.

 Quando se fazia necessário, uma boa dose de ironia, uma ironia picante, mas de alto nível, casava perfeitamente com a redação, dogmaticamente gramatical. Mas essa ironia era usada em prol da sociedade, contra os tentáculos abusivos dos poderosos.

Ele não permitia que a fantasia se acavalasse sobre sua razão, nem que a imaginação se engalfinhasse com os sentidos. Pelo contrário: se alinhava ao bom senso, ao entendimento comum.

Sérgio da Costa Franco nunca foi cogitado, ou se o foi, certamente rejeitou os louros de patrono da Feira do Livro de Porto Alegre, porque essas fantasias que ludibriam e embalam a vaidade não combinavam com a sua modéstia.

Quando a idade exigiu, ele se recolheu ao silêncio. E da caverna do seu silêncio colheu um mau sinal dos tempos. Teve que sair em busca de uma editora que assumisse a quinta edição de um de seus livros mais vendidos. Mas, não encontrou editores.

Sim, por incrível que pareça, depois de quatro edições esgotadas, nenhuma empresa do ramo gráfico atendeu aos desejos do brilhante escritor e pesquisador. E isso por uma razão muitíssimo conhecida: os livros estão em decadência, estão perdendo para esses aparelhinhos que, desprezando estilo, beleza, harmonia e gramática, ocupam o tempo de analfabetos funcionais, distraindo-os com fuxicos e abobrinhas.

Depois dessas infrutíferas tentativas, tendo que suportar a decepção que lhe trouxe esse mau sinal dos tempos, Sérgio da Costa Franco foi levado pelo destino a enveredar por caminhos mais estreitos na vida, aqueles que vão roubando as esperanças do viandante, vão lhe tirando as forças, porque, além de estreitos, são juncados de espinhos e coalhados de pedras, e neles a dor ocupa os espaços, antes ocupados pela felicidade.

 Visitado por uma amiga do ramo livreiro, Sérgio se encontrava no leito, por conta da doença que o acometera. Então, indagado pela amiga sobre como estava se sentindo, ele a olhou, com os olhos sombreados pela fraqueza, mas sem tirar dos lábios um leve sorriso de ironia, e respondeu: esperando por "ela".

E "ela", aquela que tem a posse perpétua de tudo o que sobrar de nós, veio poucos dias depois, e o levou.

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